Setor imobiliário português enfrenta desafios na transição digital
A adopção das tecnologias digitais, entre as quais se destaca a Inteligência Artificial (IA), pode revolucionar a gestão do sector imobiliário e reduzir os custos tanto para as empresas quanto para os consumidores, consideram os profissionais ouvidos pela Magazine Imobiliário. No entanto, a sua adopção pelas empresas continua lenta, e são vários os desafios que o sector enfrenta.
É o caso de Filipe Marques, director executivo e fundador da InovaDigital, que actua na área das tecnologias da informação. Considera que este sector “continua a funcionar com base em modelos operacionais fragmentados, com pouca automatização, ausência de integração real entre sistemas e grande dependência de tarefas manuais e administrativas”. Esta situação gera, na sua opinião, ineficiências acumuladas: “atrasos no tratamento de leads (contactos), falhas no seguimento comercial, custos operacionais elevados e dificuldade em escalar o negócio com controlo e consistência”.
Posição semelhante tem Javad Hatami, director executivo e cofundador da Builtrix – que actua na área ambiental e de risco energético dos edifícios –, considerando que “a adopção digital continua lenta e desigual".
Apesar das ondas regulatórias da União Europeia quanto ao desempenho energético dos edifícios, “muitos proprietários de imóveis ainda operam com infra-estruturas datadas/obsoletas” e com “sistemas isolados e processos manuais de reporte”.
Na opinião do responsável, os dados ambientais e de serviços públicos, muitas vezes, “estão dispersos entre folhas de Excel” e com “os fornecedores ou contadores negligenciados”. Na sua visão, isso é especialmente problemático quando 75% do parque edificado de Portugal é energeticamente ineficiente.
Num mercado onde os requisitos de ESG (Ambiental, Social e Governança), o desempenho energético e a resiliência dos activos estão cada vez mais interligados, “a IA já não é um luxo”, mas “a nova infra-estrutura para a criação de valor”, refere Javad Hatami.
Integrar a IA no dia a dia e no serviço ao cliente é mesmo o novo padrão, e quem não se adaptar ficará para trás, afirma Mariana Coimbra, directora de marketing da empresa de mediação ERA Portugal. Ela destaca que o grande desafio será saber fazê-lo de forma integrada com as equipas no seu quotidiano.
Mariana Coimbra adverte que o grande perigo da IA será “estandardizar demasiado a comunicação e o serviço, além de tornar as marcas cada vez mais indistinguíveis”. Acrescenta que a IA “apresenta-nos soluções que devem ser apenas, no meu entender, um ponto de partida, e ganhamos muito quando trabalhamos sobre elas”.
Para Vítor Osório, director da Structure Value – consultora que actua sobretudo na área da avaliação imobiliária –, os principais desafios tecnológicos passam pela integração de dados dispersos e pela necessidade de garantir a conformidade com normas técnicas exigentes.
“A IA tem um enorme potencial transformador no nosso sector. Permite realizar análises preditivas mais robustas, processar automaticamente grandes volumes de dados e construir modelos dinâmicos de índices e indicadores de mercado”, destaca Vítor Osório. Assim, ao automatizar tarefas repetitivas e cruzar dados de múltiplas fontes de forma inteligente, a IA pode reduzir significativamente os custos operacionais, acelerar os tempos dos processos de avaliação e apoiar decisões mais informadas e fundamentadas.
O poder da IA
Mariana Coimbra acredita que a IA trará ao ramo da mediação imobiliária uma maior capacidade de análise e controlo de qualidade. Além disso, diz que “permitir-nos-á também uma melhor segmentação dos clientes e, consequentemente, maior personalização”.
No final do dia, esta situação resultará em “mais produtividade para todas as equipas”, permitindo aos mediadores “focar-se naquilo que nos diferencia: o acompanhamento ao cliente”.
De referir que a consultora foi pioneira no lançamento de uma ferramenta de marketing digital com IA, lançada em 2022, o Lead.ERA, que permitiu automatizar várias centenas de anúncios de imóveis, segmentando as campanhas e optimizando os orçamentos em tempo real, sem necessidade de expertise ou tempo de gestão em cada agência.
No caso da InovaDigital, foi desenvolvido o X-IMO CRM – uma plataforma concebida especificamente para empresas de mediação imobiliária –, preparada para garantir a conformidade legal do sector, incluindo os requisitos do Livro de Registos Electrónico, prevenção de branqueamento de capitais e protecção de dados, entre outros deveres legais associados à actividade.
Filipe Marques considera que, do lado do consumidor, o impacto é directo. “A utilização da tecnologia reduz tempos de resposta, aumenta a fiabilidade dos dados apresentados e permite um acompanhamento mais eficaz ao longo do processo. O cliente passa a ter uma experiência mais fluida, menos sujeita a erros ou falhas de comunicação, e sente maior transparência nas etapas da compra ou venda”.
Já o responsável da Structure Value destaca o investimento na transformação digital dos processos de avaliação, com foco na eficiência, qualidade técnica e fiabilidade da informação prestada.
“Uma das soluções diferenciadoras que implementámos foi a introdução de um QR Code nos relatórios de avaliação emitidos, que foi desenvolvido internamente”, destaca Vítor Osório. Este código, integrado no corpo do relatório, permite validar e verificar de forma imediata os principais dados da avaliação, como a data, morada, tipo de imóvel, cliente e valor de mercado, garantindo assim a autenticidade e a integridade da informação disponibilizada.
No caso da plataforma da Builtrix, Javad Hatami destaca que, em oposição a soluções que exigem infra-estrutura física, esta conecta-se directamente aos dados de serviços públicos existentes (electricidade, gás, água) de centenas de edifícios, sem necessidade de sensores ou instalações novas, a menos que o cliente solicite. “A plataforma recolhe automaticamente (sem necessidade de uploads ou trabalho manual) o consumo de electricidade, água e gás, analisa os padrões de consumo, identifica picos anormais ou desperdícios e ajuda os gestores de portfólios a entender quais as propriedades que são potenciadoras de valor e quais não são”, refere o responsável.
Fonte: Magazine Imobiliário
Artigo completo em: Integração da Inteligência Artificial no imobiliário continua lenta
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